junho 27, 2010

Tudo (Quase) Normal

Aos poucos, volta a normalidade da vida no Brasil:

a) trânsito infernal;

b) burocracias para resolver no trabalho, ao invés de trabalhar;

c) aficcionados em teorias conspiratórias ao meu redor vendo minha filha (cidadã americana) quase como uma infiltrada na Grande Nação do hemisfério sul;

d) preços altíssimos para serviços ruins;

e) tolerância e adaptações com o que não devia ser tolerado (pense no carro que você compraria sabendo que ele não tem garagem para ficar: é o mesmo que você compraria em condições normais? Quão pior deve ser o carro comprado já que ele não vai ficar à noite em uma garagem?);

f) boa comida, menos artificial, mas também, em alguns aspectos, menos saborosa e com certeza, mais cara do que quando eu saí daqui;

g) adaptação ao clima seco da capital, eu estou bem, Chris mais ou menos, Bia nem tanto;

h) várias visitas a pediatras e postos de saúde: quase tudo ajeitado para Bia, dentro do possível atendimento de saúde no país;

i) e já ia esquecendo, os sacos de supermercados cada vez menores, e mais impróprios para serem usados como lixo. Quanta ecologia!!!

Devagar, tudo volta ao normal. Mas volta.

Abraços!

junho 14, 2010

Brasil nos EUA: A Pérola Burocrática

Meu retorno ao Brasil não poderia ter sido melhor caracterizado pelo meu contato com o Consulado Brasileiro de Atlanta. O Consulado atende um conjunto de estados que inclui a Carolina do Norte. Logo, todos os trâmites burocráticos que os brasileiros residentes nos EUA devem enfrentar passam por este Consulado. Fomos até Atlanta, por exemplo, para fazer o registro de nascimento da Bia, que, obviamente, ainda que o Consulado tenha feito o registro, precisou de um segundo documento a ser solicitado em cartório depois do retorno ao Brasil (uma "transcrição", o que quer que isto faça sobre um documento oficial do governo brasileiro).

Mas este post não está aqui para falar do registro da Bia. Sabendo da necessidade de revalidação do diploma, resolvi, ainda nos EUA, escrever para o Consulado buscando informações sobre como iniciar o processo. Para quem não sabe, todo o brasileiro que estuda no exterior (com exceção de alguns países) precisa revalidar o diploma para este ter valor no território nacional. Como tivemos que marcar horário para comparecer pessoalmente no Consulado para o registro, mandei o seguinte e-mail no dia 08 de abril:



"Prezado Sr(a):

Sou brasileiro, estudante de doutorado em Duke University (Durham-NC) e estou terminando o curso neste semestre. De acordo com as instruções brasileiras, o diploma do curso de doutorado precisa ser carimbado pelo consulado da minha região para iniciar o processo de revalidação do diploma no Brasil. Eu tenho algumas perguntas sobre o procedimento:
1) qual é, exatamente, a lista de documentos que eu tenho que apresentar no consulado para a autenticação? É apenas o diploma? Eu já vi alguns sites do governo (vide, por exemplo, http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12405&Itemid=867) afirmarem que é necessário também o histórico escolar, entre outros documentos.
2) por uma condição particular do meu financiamento aqui nos EUA, eu tenho que retornar para o Brasil antes que o diploma seja efetivamente emitido pela universidade. Existe algum outro procedimento para iniciar a revalidação do diploma antes de recebê-lo?
3) É necessário fazer o agendamento também para este procedimento?

Grato desde já pela atenção,

Angelo M. Fasolo"



No dia 09, recebo a seguinte pérola:

"On Sex 09/04/10 16:22 , legal@atlantaconsulatebrazil.org sent:
Somente legalizamos o original do diploma e o "official transcript".

LEGALIZAÇÃO DE DOCUMENTOS ESCOLARES E ACADÊMICOS

ATENÇÃO: a legalização de documentos SOMENTE é feita por CORREIO. Importante: a JURISDIÇÃO do Consulado-Geral do Brasil em Atlanta cobre os estados de Alabama, Georgia, Mississippi, North Carolina, South Carolina, e Tennessee e somente pode legalizar documentos emitidos dentro de sua jurisdição.

1) Históricos (school records and transcripts), cartas, certificados, diplomas, e outros documentos emitidos por schools, high schools, colleges e universities devem ser enviados no original, ou seja, devem estar impressos em papel timbrado, contendo o nome/endereço/estado da escola ou instituição acadêmica, bem como selo ou carimbo em relevo (raised seal). Cartas, certificados e diplomas devem ainda estar assinados por funcionário autorizado (normalmente o principal, register, or counselor).
2) O valor da legalização é de US$ 5,00 por cada documento escolar/acadêmico. Mais de três (3) documentos escolares/acadêmicos podem ser legalizados em forma de maço (o que significa que não podem ser desmembrados) ao custo de US$ 15,00. A única forma de pagamento aceita pelo Consulado é money order do correio norte-americano (U.S. Postal Service) nominal ao Consulate of Brazil.
3) O Consulado somente aceita correspondência enviada por envelope Express Mail do correio norte-americano (U.S. Postal Service - não confundir com UPS-United Parcel Service). Outras formas de envio como Fedex, DHL, UPS, etc não serão aceitas e seus envelopes serão devolvidos sem ser abertos.
4) Os documentos enviados por correio devem vir acompanhados de um envelope Express Mail pré-pago (ou seja, já com os selos postais) e auto-endereçado para devolução ao interessado. O endereço de devolução pode ser tanto nos EUA, quanto no Brasil. Dada a impossibilidade de o Consulado arcar com o pagamento de tarifas de correio internacional, o interessado deve prestar atenção para que o valor dos selos postais colocados no envelope Express Mail de retorno correspondam ao custo exato de envio internacional para o Brasil. Outra alternativa para os estudantes que já se encontram no Brasil é que a legalização seja providenciada por alguém nos EUA.
5) O Consulado não se responsabiliza por atrasos ou perdas de documentos enviados por correio e recomenda que a pessoa interessada anote o número de contole (tracking number) dos envelopes de Express Mail.
6) Em caso de extravio, nova documentação original deverá ser providenciada pelo interessado e um novo processo de legalização deverá ser iniciado, seguindo os procedimentos aqui descritos.
7) Documentos que sejam enviados de forma incompleta, ou seja, sem seguir os requisitos acima, não poderão ser legalizados (como por exemplo documentos que não tenham sido emitidos dentro da jurisdição, ou que não sejam originais, ou que não contenham assinaturas e carimbos) e serão devolvidos pelo envelope Express Mail de retorno fornecido pelo interessado.
8) O prazo para a legalização de documentos escolares é geralmente no mesmo dia, a partir da data de seu recebimento no Consulado, ou seja, sem contar o tempo gasto no correio. Dado que o Consulado cobre 6 estados e recebe um grande volume de documentos escolares/acadêmicos enviados por estudantes de intercâmbio, estudantes universitátios e de pós-graduação ao final do ano letivo norte-americano, o prazo de legalização nessa época pode ser mais longo.
9) Para entrar em contato com o setor de legalizações, os estudantes devem enviar email para: legal@atlantaconsulatebrazil.org .

Atenciosamente,

Setor de Legalizações
Consulado do Brasil em Atlanta
3500 Lenox Road, Suite 800
Atlanta, GA 30326"



Por partes:

1) O Consulado não presta serviços para quem já voltou para o Brasil: se o infeliz resolveu sair dos EUA, não pode mais contar com os serviços do Consulado, mesmo que consiga provar que morou em algum dos estados atendidos pela representação brasileira. Como diz a mensagem, devemos contar com a boa vontade de amigos, já que "[O]utra alternativa para os estudantes que já se encontram no Brasil é que a legalização seja providenciada por alguém nos EUA." Também não adianta pegar um avião e aparecer na sede: como diz a mensagem "a legalização de documentos SOMENTE é feita por CORREIO."

2) Obviamente, também não é qualquer correio que resolve o problema: seja por causa do pagamento do serviço, seja pelo envio do documento, o único meio válido para o Consulado abrir o processo é "envelope Express Mail do correio norte-americano (U.S. Postal Service - não confundir com UPS-United Parcel Service). Outras formas de envio como Fedex, DHL, UPS, etc não serão aceitas e seus envelopes serão devolvidos sem ser abertos." Para economistas, o Consulado de Atlanta estimula monopólios?

3) Finalmente, cabe lembrar que este não é o passo final para a revalidação do diploma: agora, o meu diploma será enviado para alguma universidade federal que reunirá uma comissão para dizer se o meu diploma é válido ou não para o exercício da profissão no país. Se vocês já observaram com cuidado a barra de links na lateral, vocês devem ter associado que dois dos meus financiadores no PhD são agências governamentais. O interessante é que o governo do Brasil gastou dinheiro para me sustentar durante quatro anos, para só depois avaliar, através dos procedimentos do Consulado e de alguma universidade, se o diploma que eu ganhei é válido no país. Ou seja, teoricamente, a bolsa de estudos do governo pode estar sustentando alguém cujo diploma não será aceito no país.

Eu juro que tentei explicar isto para os meus colegas, mas eles não conseguiram entender. Eu também tenho dificuldades para entender isto. Welcome to Brazil!

Abraços!

junho 06, 2010

Dissertação

A versão final do trabalho apresentado em Duke já está disponível no site da universidade. Para o abstract, ver aqui. Para a versão em pdf da dissertação completa, aqui.

Abraços!

junho 01, 2010

Pra Não Dizer que Não Falei...

... do tão discutido texto de Narayana Kocherlakota, Presidente do FED de Minneapolis, um breve comentário. Eu encerrei um post antigo com a seguinte frase: "[A macroeconomia moderna] apenas (ainda) não é computável de uma maneira adequada. Seja para clássicos, seja para keynesianos".

No post, eu fazia considerações sobre a inadequação da classificação americana entre economistas "de água doce" e "de água salgada", tendo em vista a convergência metodológica entre os grupos. Com a frase final, tinha deixado a idéia no ar que pretendia desenvolver em um post mais cuidadoso que aquele. Felizmente para o leitor deste blog, um economista muito mais competente e inteligente que eu formalizou os conceitos que eu ainda mal elaborava quando pensava no tema. Este trecho genial da introdução já diz tudo:



"According to the media, the defining struggle of macroeconomics is between people: those who like government and those who don’t. In my essay, the defining struggle in macroeconomics is between people and technology."



Depois de uma revisão da história da macroeconomia nos últimos 40 anos, desde a decadência dos velhos modelos keynesianos, passando pela revolução das Expectativas Racionais e do uso recente de modelos DSGE pelos governos, Kocherlakota destaca os problemas existentes para a resolução de modelos macroeconômicos mais complexos. Ele também trata da necessidade de cuidados na definição precisa das origens dos ciclos de negócios (os "choques" dos modelos) e no uso de uma maior formalização na análise de política econômica.

O texto é brilhante na análise do estado atual da macroeconomia, dos cuidados necessários para o uso dos modelos DSGE na formulação de políticas, e das perspectivas para o futuro, sempre condicionadas à evolução da tecnologia para a resolução dos modelos. A mensagem que eu creio que fica do texto é que nenhum macroeconomista abre mão de aspectos relevantes da realidade na construção de seus modelos por maldade, incompreensão, birra ou burrice: o que falta, mesmo, é capacidade de solução de estruturas mais complexas. E Kocherlakota, neste ponto, sabe muito do que está falando.

Abraços!