setembro 12, 2007

Por que ele chegou onde chegou?

Muita gente ainda se pergunta como pode uma pessoa sem qualificação técnica ou preparo intelectual chegar onde Lula chegou. Vou tentar rabiscar uma resposta aqui, aproveitando como exemplo o patético de comportamento do Congresso Nacional e das oposições na absolvição de Renan Calheiros.

O presidente atual, por mais incrível que isto possa parecer, não é uma pessoa dotada de pouca inteligência. Ao contrário do que se costuma associar, inteligência não é uma virtude criada a partir da leitura de livros, ou do tempo dentro de uma escola – o máximo que livros e horas de estudo fazem é aprimorar o material já existente. Nesta perspectiva, Lula pode, naturalmente, ter chegado onde chegou: horas de estudo não é pre-condição para o cargo de Presidente da República. Por outro lado, nenhum ignorante em política, por maior que seja o título acadêmico, é capaz de ser eleito para cargo de tamanha relevância.

Onde eu quero chegar com isto? Vou citar exemplos da trajetória do presidente durante as eleições e no governo para mostrar a existência de um "padrão Lula" nas atividades políticas que justifica a sua popularidade atual.

Lembram da propaganda na campanha, quando ele aparecia em meio ao comitê do PT, cercado de técnicos, dando a clara idéia que ele tinha assessores muito capazes e com propostas sérias para todos os problemas do país? Pois bem: quantos daqueles assessores ainda continuam no governo? Qual era o objetivo de mostrar aquele bando de gente (todos do PT) trabalhando? Basicamente dois: a) mostrar à classe média e alta, que é quem decide eleição no país, que Lula poderia não ser bem preparado, mas tinha um bom suporte ao seu redor; e, b) mostrar ao pessoal do PT que, em última instância, mesmo estando em uma coligação, o governo seria um governo "do PT".

Pois bem. Passados todos os escândalos, quantos daqueles "técnicos preparados" continuam por ali? Se tirar alguns da Fazenda, Casa Civil e alguns poucos ministérios de menor relevância, não sobra nada. O que houve? Lula "se enganou" a respeito da competência do partido? Não. Lula, como faz com todos, usou o partido para chegar onde chegou. Quem saiu da (sua) linha, foi triturado.

Na política econômica, lembram quando Lula deixava recados que "estava descontente com as taxas de juros"? Cheguei a falar disto em outro post, onde tratava da relação entre jornalistas e políticos em Brasília. Pois não é que a imprensa (e parte do PT) ficou absolutamente estarrecida quando descobriu que foi Lula quem forçou uma meta de inflação mais baixa, ainda que a custos de juros mais altos? A técnica aqui se aplica de novo. Lula faz o que considera correto. Se for algo que desagrada ao PT, manda recados, dizendo que não gosta do que está sendo feito. Mas para o público externo, fica a imagem do timoneiro que adotou as medidas duras para garantir o crescimento do país.

Mais exemplos da técnica? Onde está José Dirceu? Reapareceu, agora, em função do julgamento do Mensalão. Mas, fora disto, é um blogueiro de excelentes contatos. E só. Quando Dirceu foi flagrado no caso Waldomiro, Lula fez que não ouviu. Quando Dirceu foi pilhado no escândalo do Mensalão, Lula adotou a posição mais dúbia possível: ficou quieto, aceitou uma carta de demissão, deixou o seu partido ser triturado; quando a maré baixou, afirmou que "os companheiros devem ser perdoados pelos seus erros", mas, quando pressionado, afirmou, publicamente, que demitiu todos os envolvidos no escândalo. Ou seja, saiu bem com todos: para o PT, ofereceu o perdão; para o público, "demitiu" a todos que "o traíram".

Outro caso relevante: Palocci. Uma surpresa na área econômica, ministro de projeção que sustentava todas as brigas contra o próprio partido – afinal, o governo tinha que ser "do PT", como dizia a propaganda, não? – Palocci foi pilhado no escândalo do caseiro. O que fez Lula? Mais uma vez, ficou quieto, cercou-se de todas as certezas que a economia não iria ser afetada, para daí aceitar a carta de demissão do então ministro. Para o público interno (o PT), mais um "perdão pelos erros"; para o público externo, a "demissão" de quem faltou com o decoro.

Também serve de exemplo o acidente com o avião da TAM. Onde estava Lula na hora do acidente? Ninguém sabe, ninguém viu. Qual foi a ação política do Presidente nesta hora? Demitiu um ministro (que não era do PT, diga-se) e encontrou alguém deslumbrado com a vitrine que o cargo da Defesa daria (Jobim). Lula mexeu em alguém ligado ao partido? Não. Zuanazzi (indicado por Dilma) ainda está na ANAC; a diretora indicada por Dirceu pediu demissão (como o chefe, não foi exonerada). Mais uma vez, a técnica: para o "partidão", o perdão pelos erros; para o povão, o "rigor do líder". O ônus da reorganização do setor (se é que será reorganizado) ficará todo nas costas do novo ministro deslumbrado.

E Renan com isto?

Aí o leitor que ainda não me largou - como todos sabem, este blog tem oito leitores, sendo que apenas dois deles lêem tudo até o final - vai estar perguntando: e o que o Renan tem a ver com toda esta história?

Renan foi absolvido por seis votos. Quem está comemorando com isto, além de Renan? Sarney, grande aliado do atual Presidente, sinalizou com todos os seus votos pró-Renan. Relatos chegam dizendo que Mercadante e Ideli Salvatti fizeram discursos em plenário em favor de Renan. Por que toda esta mobilização dos aliados para salva-lo? Respondo com outra pergunta: para que Lula precisa do Senado neste ano, que nem é ano eleitoral ainda? Que coincidência: não é que está para ser votada a prorrogação da CPMF? E não é que Lula não conseguirá aprovar o imposto sem o apoio do PMDB, uma das maiores bancadas do Senado? Que coisa, não?

Fica a previsão, para encerrar o texto. Renan fica até a CPMF ser aprovada. Depois disto, vai aparecer um novo escândalo, e as "forças populares", capitaneadas pela máquina do PT, vão invadir o Congresso exigindo que o Presidente do Senado seja deposto. Depois de Renan ser cassado, Lula virá a público, alegre e faceiro, dizendo que "nunca neste país tanta gente com tanto poder foi investigada". E a oposição, ao invés de denunciar a manobra desde já, como deveria ter feito repetidas vezes nos outros escândalos (lembram da tese corrente, durante o Mensalão, de "deixar o Lula agonizar para ganhar dele nas eleições"? Pois é...), vai ficar com cara de otária, vendo Lula aparecer para o povão como o salvador da moralidade brasileira.

Que tristeza.

Abraços!

P.S.: não acredito na tese de que o PT votou para absolver Renan porque estava com medo do que ele poderia fazer se condenado. Muitos outros, e em piores situações, poderiam já ter colocado a boca no trombone e não fizeram. Para mim, o que existe é método: Lula tem o seu método de fazer política, e está dando certo. Renan já está condenado, podem apostar. O que vai fazê-lo ficar mais ou menos tempo no cargo é a demora na aprovação da CPMF. E só.

2 comentários:

Anônimo disse...

Opa!
Que honra! Sou um dos 8 leitores! E mais: sou um dos 2 que lêem até o final (exceto quando é muito específico de economia, pq não entendo lhufas do que está escrito...).
abraço,
Menin

Anônimo disse...

Oi, Menin! Eu sou a segunda! (eu gosto da leitura, mas, mesmo que nao gostasse... sabe como e', ne'? Depois, tem arguicao em casa... hahaha!)