junho 08, 2011

Mais Chari

Tive acesso hoje aos vídeos do último Seminário de Metas para Inflação e resolvi, ao invés de ficar apenas na frase de V.V. Chari citada no último post, trazer a transcrição (feita por mim) de dois trechos muito legais do que ele falou.

Primeiro, sobre a crise financeira de 2008, uma diferenciação importante sobre risco privado e risco social, e (falta de) soluções fáceis através de política econômica:

"Markets did not privately under price the risk, markets correctly priced the risk, because they correctly perceived that the risk was extremely small. The risk may have been large for society overall, but it was not large for each individual, person planning to do the investment. To people who say 'markets just under priced risk, markets are stupid!', I say yes, that's certainly a possibility, markets get the wrong answer lots of different times. But you got to remember: markets consists of thousands, sometimes hundreds of thousands of participants. So, there are these guys who are just stupid, idiots. And then we are going to find ten selected policy-makers. Bingo! These guys are going to be smart, these guys are going to figure out exactly what is going on, these guys are going to understand risk. And they are going choose to do all this by the modest sum – I think the Federal Reserve Board members are paid – 185 dollars when they could go out to the market and using all that incredible smartness to make 185 billion dollars! But, of course, they are public servers, so they will do all those kind of things..."

A diferença entre risco privado e social deve-se, segundo Chari, exatamente por causa da percepção por parte dos bancos, que assumiam empréstimos de risco, que seriam salvos. Ou seja, todos os agentes se comportavam de forma racional, dado o desenho do mercado de crédito nos EUA.

Mais tarde, a lição sobre política monetária:

"I always thought that the first attribute of a Central Banker is humility. Inflation targeting is an expression, not of arrogance, but of humility. There are things that Central Banks are good at doing: inflation. And we understand that, and we promise we are not going to look at that. The counterpart of that humility is that Central Bankers can not resolve the problem of AIDS, can not erase poverty in Africa, can not prevent the erosion of the Amazon forest and have only a limited effect on aggregate output. That is the first attribute of rational intelligent Central Bankers."

Abraços!

4 comentários:

Irineu de Carvalho Filho disse...

O primeiro argumento do Chari eh meio bobinho.

Primeiro, nao eh pagando bilhoes para A ou B que risco sistemico vai ser identificado e regulado.

Segundo, os banqueiros ganhando bilhoes nao necessariamente chegaram a sua posicao devido a seu skill em reconhecer riscos. Digamos, hipoteticamente, que o Paul Krugman/Ben Bernanke/Outro Economista saiba reconhecer riscos melhor do que o Jamie Dimon. O que garante que ele teria o posto do Dimon? Nada.

Ja o segundo argumento eh de estupidez religiosa. Como que o Chari decidiu que bancos centrais tem "a limited effect on aggregate output", limitado suficiente para garantir que a escolha otima eh nao fazer nada quanto ao nivel de produto? O que o Chari tenta vender como ceticismo pe-no-chao nao passa de crenca que ele nao consegue embasar em fatos ou testes empiricos. E nao consegue porque a crenca eh falsa!! Eh parte do treinamento minimo de macroeconomia ensinar os adolescentes que o advento de bancos centrais com mandatos cobrindo a estabilizacao das flutuacoes economicas coincidiu e muito provavelmente causou a reducao nas flutuacoes economicas observada no periodo pos-Grande Depressao.

Angelo M Fasolo disse...

Irineu,

Antes de mais nada, obrigado pelo comentários.

Aos teus pontos:

1) Sobre o primeiro argumento, ele estava sendo extremamente irônico com a questão do reconhecimento de riscos ao citar a diferença entre o dinheiro que "pessoas capazes de identificar risco" poderiam fazer no mercado, ao invés de trabalhar no setor público. Todo o primeiro parágrafo que transcrevi, ele falou tentando se controlar para não rir explicitamente da crença de alguns que "bastaria selecionar estes iluminados para resolver os problemas de risco sistêmico". Ou seja, vcs concordam neste ponto, ele apenas foi irônico ao extremo no assunto.

2) Vc conhece algum artigo que mostre a causalidade entre política monetária e a Grande Moderação? Até onde eu saiba, esta discussão ainda está em aberto sobre "sorte vs boa política" nas causas do evento (e, mesmo que boa política seja a causa da moderação, há quem argumente que os efeitos em termos de welfare da grande moderação são muito pequenos - ver Pancrazi, 2010, "Who Cares About the Great Moderation?"). Estudos que calculam os efeitos da politica monetária sobre o produto mostram efeitos relativamente pequenos (CEE 2005, Uhlig 2005). Talvez a grande surpresa da crise seja justamente o fato de mostrar que a política monetária é ainda mais ineficientes sobre o produto do que inicialmente se pensava, já que o Japão convive com taxas de juros próximas de zero há muito tempo, e os EUA estão completando quase três anos de taxas próximas de zero sem efeitos significativos sobre o produto... Por fim, os estudos sobre política ótima mostram, sim, que inflação baixa e de pouca volatilidade deveria ser o objetivo principal da política econômica, ao invés de estabilização do produto, mesmo na presença de fricções financeiras no modelo.

Abraços!

Irineu de Carvalho Filho disse...

“Vc conhece algum artigo que mostre a causalidade entre política monetária e a Grande Moderação?”

Não é esse meu ponto, pois o que se convenciona chamar de Grande Moderação é diminutivo em comparação com a moderação ocorrida depois dos anos 30. Existe uma grande divisão histórica em macroeconomia. Antes do advento do banco central moderno, keynesianismo, deposit insurance e do fim do padrão-ouro, as flutuações macroeconômicas eram muito mais profundas e destrutivas do que no período pós Grande Depressão. Portanto, existe um caso bem forte a favor do papel de políticas macroeconômicas e prudenciais na estabilização do produto que o Chari escolheu esquecer.

“Talvez a grande surpresa da crise seja justamente o fato de mostrar que a política monetária é ainda mais ineficientes sobre o produto do que inicialmente se pensava, já que o Japão convive com taxas de juros próximas de zero há muito tempo, e os EUA estão completando quase três anos de taxas próximas de zero sem efeitos significativos sobre o produto...”

Sugiro meu artigo sobre o desempenho dos países com IT depois da crise. Os benefícios de ter uma política monetária parecem-me bem substanciais.

“Por fim, os estudos sobre política ótima mostram, sim, que inflação baixa e de pouca volatilidade deveria ser o objetivo principal da política econômica, ao invés de estabilização do produto, mesmo na presença de fricções financeiras no modelo.”

Isso é perda de tempo, sorry. Política ótima em um modelo DSGE com meia dúzia (ou menos) de variáveis estado não é política ótima no mundo real. Não tenho nada terrivelmente contra a idéia de se trabalhar com modelos, tanto que eu mesmo às vezes os uso, mas a tal humildade que o Chari prega pode melhor ser aplicada nas prescrições normativas dos modelos do que nos objetivos dos bancos centrais.

Irineu

Angelo M Fasolo disse...

Começando pela ordem inversa desta vez:

1) "Isso é perda de tempo, sorry. Política ótima em um modelo DSGE com meia dúzia (ou menos) de variáveis estado não é política ótima no mundo real."

Estava pensando, por exemplo, em Schimitt-Grohé e Uribe (2005), com 36 variáveis no modelo, Battini et all (2009), com 26 variáveis mais choques e as contrapartidas da economia do resto do mundo. Se a determinação do que vc considera como "ótima para o mundo real" está baseada no número de variáveis, pode ler tb minha tese, com o modelo de 86 variáveis. :-)

Sorry, mas problema, para mim, é dizer que algo é "ótimo" sem uma métrica: a métrica do Irineu é diferente daquela do Angelo, que é diferente do João, do Pedro e da Maria. Mas modelos (DSGE ou não) nos oferecem métricas para dizer se algo é ótimo ou não.

2) "Os benefícios de ter uma política monetária parecem-me bem substanciais." e "Portanto, existe um caso bem forte a favor do papel de políticas macroeconômicas e prudenciais na estabilização do produto que o Chari escolheu esquecer."

Não entendi a mensagem do Chari como que pregando "ausência de política monetária", "ter ou não ter política monetária". Ao contrário, interpreto como uma consideração que a política monetária é muito mais eficiente para controlar preços/inflação, e que outros instrumentos são mais razoáveis para operar sobre o produto.

Abraços!