fevereiro 10, 2007

RJ: O Que Vou Dizer?

Alguns colegas vêm falar comigo sobre o Brasil, dizendo que tem muita curiosidade em conhecer o país, que "Kôpakabána" deve ser linda, que gostam de escutar "bôssa-nôva" e querendo saber mais detalhes. Diante dos acontecimentos dos últimos dias na cidade do Rio de Janeiro, resolvi criar uma programação especial de uma semana para que os turistas conheçam todos os detalhes da ex-Cidade Maravilhosa:

Dia 1: A Chegada!
Desembarque no aeroporto do Galeão, com ligação direta da sala de desembarque para vans ilegais que te levam para conhecer todos os morros da cidade, ainda que o seu destino seja Ipanema. Veja de perto moleques de recado do tráfico carregando armas de pequeno porte e rádios-comunicadores para avisar a chegada da polícia. Não deixe de fazer a sua contribuição para a Fundação Recreativa e Cultural Amigos do Zé Cabeleira, chefe de facção criminosa que foi injustamente assassinado pela polícia enquanto tentava cobrar o "dízimo" pela segurança de uma moradora da favela. De fato, não deixe de fazer a sua contribuição, ou você não terá oportunidade de fazer mais nada no passeio...

Dia 2: O Calçadão de Copacabana
Vale a pena gastar um dia inteiro por lá! Durante o dia, sinta a emoção de bater de frente com algum arrastão de pivetes que descem do morro para promover a melhora na distribuição de renda na cidade. Como é linda a política social feita de forma tão direta, tão integrada com o povo!!! À noite, descubra o indivíduo com menor ficha policial no início da Barata Ribeiro (não vale o pessoal que trabalha no Cervantes) e ganhe um vale que dará direito a um dia no Piscinão de Ramos! Siga a sua caminhada em direção à Ipanema e veja a ampla variedade de prostitutas, travestis e simpatizantes com suas abordagens sutis na frente dos hotéis à beira-mar.

Dia 3: Conhecendo as Origens da Bossa-Nova
"Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça!!!" Chegou a hora de conhecer os lugares que marcaram a vida de Tom e Vinícius. Pague algum moleque de rua explorado pela mãe para conseguir alguns trocados que o levará até a Rua Vinícius de Morais. Dê mais alguns trocados, e o rapazinho lhe ensinará as novas tendências do movimento, como as letras melodiosas de Tati Quebra-Barraco e Bonde do Tigrão. Encerre a noite no Bar do Tom, com prostitutas reunidas em uma mesa dividindo uma única Coca-Cola (têm que ter algum consumo para ficar no lugar), cafetões fazendo a vigia e turistas com o tom de pele vermelho-camarão típico se esbaldando em cerveja e drinks com garotas "selecionadas".

Dia 4: Maracanã
Emocione-se vendo os orçamentos da eterna obra inacabada do maior estádio de futebol do mundo (ainda que a última partida importante tenha sido disputada em... em... hummm... peraí... putz, tenho que buscar nos arquivos). Tudo está sendo preparado para o Pan-Americano que será disputado neste ano: cambistas devidamente treinados para tirar todo o lucro nos preços dos ingressos, vendedor de amendoim aprendendo a vender em qualquer língua (menos em espanhol, já que, como falamos português, basta pronunciar as palavras mais lentamente que nos entenderemos), a tia que vende churrasquinho está com o estoque de gatos prontos para serem assados por quase um mês. Mas, peraí? Tem competição de futebol no Pan???

Dia 5: Visitas Guiadas
Conheça todo o lado primitivo da ex-Cidade Maravilhosa: pegue o ônibus da linha 147 e sinta-se na pele dos alvos do marginal (que era vítima da sociedade burguesa-capitalista-neoliberal-boba-comedora de jiló que o corrompeu) que virou filme documentário pago pelos contribuintes através do patrocínio de empresas estatais. Também aproveite para dar uma parada na frente da Igreja da Candelária, para enteder a profundidade da obra do massacre de mendigos do local. Por fim, se o turista tiver um pouco mais de dinheiro disponível, alugue um carro e pare nos sinais das esquinas mais apropriadas para sentir toda a emoção de um assalto como só os típicos moradores da cidade podem sentir. Advertência: se levar crianças, não as coloque no banco traseiro do automóvel. Elas podem ser confundidas com um "boneco de Judas" pelos nativos corrompidos e se machucar.

Dia 6: Iniciando as Despedidas
O passeio começa a chegar no final, e as últimas horas devem ser aproveitadas com algumas compras!!! Nada como gastar uma pequena fortuna para comprar aquelas camisas floreadas, com as cores que apenas os turistas do hemisfério norte sabem escolher. Além da "beleza natural" das camisas, elas ainda possibilitam a fácil identificação dos clientes para as últimas passagens do arrastão final! Que falta vai fazer este contato com o povão, os gritos de "perdeu, tio, perdeu"!!! Outras compras fundamentais: cachaça (para que os porres resultantes façam apagar da memória as noites em que o infeliz terminou abraçado em um travesti), café (para curar os porres), hidratante (para manter o tom vermelho-camarão único na pele).

Dia 7: O Retorno
Se a Infraero deixar, o seu avião sairá com poucas horas de atraso. Afinal de contas, é impossível deixar de gostar da cidade do Rio de Janeiro, e você se sentirá plenamente recompensado por permanecer mais algum tempo neste local paradisíaco!!!

Para os meus amigos cariocas, é muito triste escrever isto, mas só com um bocado de humor para levar adiante a vida depois de eventos macabros como os recentes. Infelizmente, quando me perguntam o que eu recomendo no Brasil, digo que o Rio de Janeiro é ótimo como aeroporto, porta de entrada, mas ficar por lá é perda de tempo e um perigo. Normalmente, recomendo o interior do Estado (não deixo nunca de falar de Búzios, por exemplo), o Nordeste (mesmo com os problemas relacionados à pobreza, é um lugar maravilhoso) e até Brasília (uma visita de poucos dias, conhecendo a arquitetura do local, é interessante). Mas o Rio, cidade, nem pensar: quero o bem tanto dos amigos daqui quanto dos amigos daí.

Abraços!

P.S.: ainda estou procurando a data do último jogo de futebol importante disputado no Maracanã...

Nenhum comentário: