dezembro 02, 2006

Led Zeppelin, O Bonde do Tigrão e o Regime de Metas no Brasil

Uma das grandes vantagens do regime de metas de inflação é estabelecer uma aplicação direta do chamado "Axioma da Preferência Revelada". O axioma, com este nome horroroso, diz basicamente o seguinte: se você pode fazer uma escolha entre A e B, e escolhe A, então ou você gosta mais de A do que de B, ou você não pode comprar B. Por exemplo, digamos que você tenha alguma grana guardada no final do mês e resolve comprar um CD. No mercado, existem três tipos de CD's: o box com três CD’s do Led Zeppelin “How the West Was Won”, que custa quase R$ 90,00; o disco “Reptile” do Eric Clapton, por R$ 18,00 (boa música garantida); ou o último CD do Bonde do Tigrão, vendido no camelô da esquina (versão pirata) por R$ 2,00. Se você tiver R$ 20,00 no bolso, eu espero (mais do que isto, torço!) que você compre o CD do Eric Clapton, porque: 1) o disco do Led Zeppelin é caro; e 2) você não gosta do Bonde do Tigrão. (Estou propositalmente excluindo possibilidades como "o CD do Led Zeppelin vendido no camelô por R$ 10,00, ok?)

Voltando para a discussão sobre o regime de metas de inflação, o debate na imprensa deveria dar um passo adiante, através de considerações baseadas na lógica acima. Por exemplo, em 2005, o sindicalista Luiz Marinho chegou a pedir a cabeça dos diretores do BC por causa de um aumento de juros. Em 2005, a inflação fechou acima da meta estipulada pelo governo. Logo, na lógica do sistema de metas de inflação, o BC, na prática, teria errado ao não usar juros mais altos para enquadrar a inflação na meta. Agora, em 2006, o Ministro do Trabalho diz que o resultado do PIB faz parte das “conseqüências de uma política monetária conservadora”, ainda mais porque as projeções apontam para uma inflação de 2006 abaixo da meta – ou seja, o BC deveria ter baixado mais rapidamente os juros.

A lógica do Ministro para 2006, a posteriori, está correta já que o BC pode, no máximo, estimar o comportamento atual da economia quando fez a decisão de juros – ou seja, culpa de quem errou a projeção (eu??? hahahah). Entretanto, e aí dando um passo adiante, poderíamos aplicar o “Axioma” para chegar a duas conclusões possíveis a respeito do atual Ministro do Trabalho: 1) ou ele não entende nada de política econômica, pois não vê que o BC não tem como atingir no curto prazo a combinação “maior crescimento + inflação baixa” (ou seja, o box do Led Zeppelin); ou, 2) ele gosta de inflação (ou seja, o CD pirata do Bonde do Tigrão), já que, para qualquer relação entre a taxa de inflação e a meta estipulada pelo governo, o ex-sindicalista vai sempre preferir juros mais baixos.

Evidências sobre a hipótese número 1 do comportamento do Ministro do Trabalho podem ser encontradas em vários lugares: todo o dia aparece alguém na imprensa usando o BC como bode expiatório, ainda que a escolha da meta de inflação seja atribuição exclusiva do governo. O CMN, ao escolher a meta, conta com dois votos do “governo”, contra um do BC, assumindo-se que o BC seja parte efetivamente independente do resto do governo. Ou seja, no regime de metas, quem escolhe a meta, em última instância, é o governo, e o BC que a execute. Querer o CD do Led Zeppelin (mais crescimento com inflação baixa), todos querem, mas o BC só pode cuidar de um pedaço do problema.

A respeito da hipótese número 2, eu também não duvido da sua comprovação. Vale lembrar que os sindicatos, no Brasil, ganharam muita força justamente na época de inflação elevada, onde as categorias organizadas conseguiam garantir aumentos muito mais expressivos em relação aos setores não-sindicalizados. Sem a ilusão gerada pela inflação alta, os aumentos salariais ficam restritos ao que for possível, e isto diminui muito o poder de barganha dos nossos “companheiros”.

Se o Ministro acha que os juros estão muito altos, que faça direito o seu trabalho, ou que arque as conseqüências e venha a público dizer que acha que “um pouco mais de inflação não faz mal ao país”. Vale o mesmo para outros ministros, sindicalistas ou pseudo-empresários. Esta é a preferência, a escolha, que o sistema de metas traz à tona, e que poderia ser melhor explorada pela imprensa. Outro dia, o Reinaldo Azevedo, no seu blog, estava perguntando onde é que estavam as pessoas que gostam de mais inflação, que o presidente do BC ficava apontando. Consegui deixar um rascunho de resposta?

Abraços!

Um comentário:

Anônimo disse...

acho que os companheiros gostam do Bonde do Tigrão: "é uma manifestação genuína da cultura brasileira" ao invés desta música "enlatada, yankee, neoliberal, entreguista" que você, ó traidor da pátria, citou ao longo do texto... ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!ha!